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lunes, 23 de mayo de 2022

Os domingos de Lisboa são terríveis de passar

 


A Alexandre O’Neill e a Ana Cristina Leonardo







Os domingos de Lisboa são terríveis de passar – e tu que o digas!

Mas não está tudo como de antes. Mentira!

Coisas há que estão piores. O resto são cantigas.

A menina que passa moda é tolinha, mas, vá lá, é gira.



Cá andamos, armados em europeus de sobrepeliz coçada

(não todos -- os Homens de Estado vão ao cobre do erário;

e que o pague o marçano, o pobre que trabalha, essa cambada,

o suburbano, o empregadito, o liberal, o funcionário).



E pedem que cantemos o peito ilustre lusitano? Não.

Peitinho de menina, sim, ou peitinho de franga.

Por favor Madame tire as patas, as patas do seu cão,

da mesa. A gerência agradece. E viva a canga.



Ministros, depois banqueiros, administradores, Filhos da Pátria.

Pátria podre, putre, pútria, cheirando a sovaco à beira rio,

a escovar-se a piaçaba destes Filhos da Pútria Pátria

Filhos da Pátria, da Pátria Pútria, da Ganda Pútria que os pariu.



País de lambe-cus, de oficiosos, de beleguins e jornalistas a pataco

Cerviz ao chão , ó vocação antiga dos mansos pela trela,

abanam rabos , dão a patinha, por coleira, ração, gravata, belo casaco

última moda em loja fina da nação -- e só para quem come dela.



Contribuintes, alguns; nunca os que mamam. A teta vai gasta

de tal derriço. Sacam bolsa e vida este ladrões – e sem aviso.

Mas uma senhora é uma senhora. Só vê malícia quem a tem. E basta.

Uma senhora passa e ladrar é o seu dever – se tanto for preciso.



A inspecção irónica dos bolsos, eis o que nos sabem oferecer

os demorados fiscais à procura de uma fresta.

Que tempo este, meu deus! Uma senhora , sem o saber,

está sempre em perigo e à mercê dessa Grã-Besta.



Isto é um país de esgoto. E que pena, Alexandre. Parecia coisa fina.

A vilanagem come tudo!. Amanhã talvez, mas hoje já não se fia.

Ó povo acocorado! O que nos vale a nós, Ana Cristina,

É que ainda e sempre por aí há quem medite na pastelaria.





Março de 2012


Fernando Cabrita. Quarenta poemas. Catita & Compania. 2012

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