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domingo, 13 de agosto de 2023

A BALADA IMPOSSÍVEL




Cantaria, assim pudesse, todo um poema novo – um poema

de heróis limpos e sedutores

de heróis que falassem ininterruptamente a novilíngua

onde tudo é igual a tudo    menos à realidade.

Poema  sem fanáticos cortando gargantas,

sem deuses incitando ao ódio e à destruição,

sem Anjo Gabriel a traficar missais e heroína.

Oh, sim, cantá-lo-ia!

Um poema acautelado e tíbio onde não morassem

panfletos e seringas, borboletas afiadas,

turbantes e ódio, anjos degoladores,

querubins de pelo curto e Doc Martens nos pés,

profetas e patriarcas comerciando-se aos milhões,

corrupções, euros, largos baluartes do vício e do crime no

Parlamento de Onde-Seja, dólares, yens,

acções escondidas, bancas falidas,

vetustos ignóbeis padres chamuscados

de ventos de súlfur,  religiões de ódio e dor,

pedófilos e crentes, emires e devotos carrascos,

penitentes caridosos e ruins, matadores de honras e vidas,

assassinos de louvar a deus, patriarcas de bordões armani e inconsútil barba,

santos rudes a desabitar improváveis morabitos,

lumbersexuais proféticos exalçando vozes aos céus de Coisa Nenhuma,

adoradores da morte dos demais, homicidas a galope,

ermitões de ver a deus nas páginas da Vogue,

jhiadistas a posar para os canais da moda,

monges obscuros de sangue na lapela,

límpidos varões a canforar impoluídos ares,

multidões sob as pontes de Londres numa

Terra sempre Sem Vida, gasta,

estéril, onde já nem Phlebas, o fenício, dará à costa.

Poema onde não morasse nada, nada que chocasse,

onde morasse apenas o exactamente consentido.

 O Tempo Novo é o tempo velho, todos os tempos.

Pudesse eu e cantá-lo-ia, num poema novo, revigorado, oficial,

onde bailassem polkas e mártires decadentes.

Cantá-lo-ia, sim!

Virgens insensatas parindo,

no entanto parindo, entre sístoles e geografias.

Cantá-lo-ia, entre os vãos de todas as janelas, atrás ou

à frente das vidraças por abrir.

Todo um poema novo de construção pseudo-destrutiva,

ao gosto de época, bem ao gosto da época,

cheio de palavras correctas e de nenhuma proibida,

toda a batota verbal onde se dissesse o que os demais queiram ouvir,

bem ao sabor dos pequenos vendavais do espírito mais comezinho,

um poema de mãos largas sempre a declarar-se anticonvencional,

moderno, giro, mais que moderno: modernaço,

poema de ideias soltas, a inaugurar estilo,

poema de ideias excrementícias

-- ainda que um poema se faça não tanto de ideias mas de palavras –

e de palavras que pareçam ferozes, mas não mordam,

de palavras que se afirmem lavradas no enxofre da língua,

na cinzenta crueza dos purgatórios mortos,

no execrável labirinto de cavernas infinitas;

mas afinal palavras esmeradas,

paridas em laboratórios mansos

onde a criação seja afável e o ministro consinta

e a igreja permita    e a economia não vede.

Cantá-lo-ia, pois, como um arauto dos tempos novos

mas semelhando contracorrente, contradição, contrassenso,

contravenção, contracultura

porém afinal apenas contrafacção, tu bem o sabes,

mas esperando, claro, a contrapartida,

um poema onde o Lobo de Rimini jamais sodomizasse o

pequeno bispo Fano, núncio papal em tempos conturbados,

um poema asséptico, sem gulags, sem campos de concentração,

sem muros e sem bombardas,

poema onde os rios corressem limpos como os de Rodrigues Lobo,

as saudades fossem ainda as de Bernardim

e os ares fossem para sempre respiráveis;

e onde eu me proclamaria dizendo sonoramente “as minhas

palavras são esculpidas pelo cinzel da pútrida exclamação,

da pútrida arquitectura”,

-- mas não, meu amor, tu sabes que não seriam! --

 e anunciaria falsamente, na soberba

língua dos tolos agora espertos

“eis os meus versos, edifícios de escândalo!,

eis o meu poema, navio condenado!

 eis a minha Palavra, oficina de vícios e desdéns!

eis o meu trote agreste na garganta maldita dos serafins caídos!”;

mas tudo soaria depois a oco, bem sabes,

tudo a ninho de palavras estupefacientes.

Cantá-lo-ia, se tudo quanto se me agita afinal na alma não fossem

palavras indecifráveis na boca queimada de deus,

na desdentada boca de deus,

palavras fuziladas uma a uma sobre a decência das coisas,

palavras de Ítacas ardidas, versos que fossem um Moloch perna de pau,

uma tabuada de súcubos e donzelas podres,

de mendigos, dos teus mendigos, Álvaro!, mijando sobre os nossos

destinos e propósitos,

labareda acesa, petróleo frio sobre as dimensões do tempo,

rocha vitrificada, marca de água de querubins e quimeras que

andassem no lixo a buscar o que comer.

Ah, pudera eu! Pudera eu e cantá-lo-ia!

Cantá-lo-ia, a esse poema novo em que não

houvesse chão duro mas somente

nuvens diluídas nas vastidões do céu;

em que não assomassem mendigos,

andrajos, pobres, casebres, misérias desocultas,

e onde tudo fosse um raio benigno de sol e um louvor mesmo que mascarado.

Pudesse! e seria eu um poeta maldito, o Poeta Maldito,

o aparentemente Intolerado, o Irreverente,

porém acarinhado pelos poderes, abençoado por todas as santidades,

louvado por todos os gabinetes.

Pudesse! e comporia esse poema novo sem burlas incomensuráveis, sem escroques de

pátria na lapela, sem biltres de cargo e caldeira.

Nele não haveria cheiros a João Huss queimado,

nenhum grito de Steve Biko espancado,

nenhuma agonia de curdos, nenhum Khashoggi esquartejado,

nenhum banco assaltado a partir de dentro,

nenhuma mulher violada nas prisões de Pinochet,

nenhum poeta decapitado nos ergástulos sauditas,

nenhuma masmorra com água, nenhum crime de guerra,

nenhum morto indefeso nas ruas de Myanmar,

nenhuma bomba sobre o Iémen,

nenhum velho solitário numa água furtada esconsa,

nenhuma venda de armas democráticas, nenhuma líbia ardida,

nenhuma biblioteca em chamas, nenhum voto vigarizado,

nenhum afilhado a expensas do erário.

Seria um poema submisso ainda que protestasse insubmissão,

 um poema delicado ainda que aparentasse revoluções,

batendo três vezes no peito o nome da revolta para

outras tantas a negar ao bater de cada letra do teclado mole.

Seria um poema onde nenhum Perseu degolaria a Medusa,

nunca se saberia Palmira a velha derrubada e

Khaled al-Asaad decapitado por amor a ela.

Nele Maldoror não encontraria Lautréamont que o cantasse,

ao Decepado não lhe cortariam as mãos

nem Judas beijaria Cristo ao cantar das luas na cidade.

Ninguém ali se levantaria, como tu dizes, Uberto,

contra los versos exquisitos y subalternos,

acorrentados às escavadoras

para travar a destruição da sua terra e da sua consciência,

e todos seríamos convidados para os palácios de Doñana.

Ah, cantá-lo-ia! Um poema

que fosse um longo e largo silêncio, pese

embora feito de muitas palavras,

uma ode morta, um rol de alexandrinos secos,

flores do bem a vomitarem baudelaires.

Uma canção aplaudida por analfabetos funcionais,

levada às televisões nos horários nobres,

condecorada oficialmente com pendões e ordens protocolares,

gratificada com espórtula, amaciada com os melhores cosméticos,

perfume e rosa e sons pré-gravados de primaveras e ribeiros,

só coisas doces e suaves, amores diáfanos e perfeitos

rosas desfolhadas a criar ambiente e luz.

E nenhuma aflição,

nenhum bêbedo feliz que fale só, meu bom Cesário,

e nenhum que ensine a filha a ler à luz da candeia.

Mas o que sei e sinto não caberia afinal no poema.

O que sei e sinto são adagas, mistérios,

peões mortos nas trincheiras em todas as flandres

que houver pudessem, grumetes dependurados nas gáveas,

pássaros equivocados, gente que se deita com fome,

avós abandonados, secretários rascas, acanalhados profetas,

ladrões de estola e carmim, banqueiros que esvoaçam em bando

ao cheiro fresco do sangue da manada.

O que sei são gente esquecida nas esquinas da vida,

soçobrada nas pautas das economias, afogada no vazio das estatísticas.

Viro a página da alma e as gravuras reproduzem ilhas

onde a miséria ainda irrompe, bairros de degredo e impureza,

droga urgente, clandestina, cáustica –

e perniciosos mandarins na luz majestosa dos bonzos,

régulos manajeiros das grandes Comissões,

patetas monumentais a dirigir a orquestra do mundo,

tolos duvidosos debruçados na janela alta da Terra,

Camões a pedir a tença triste.

Nenhum rio corre sem barragens que o tolham

e todas se vendem

e todas se compram

e todas se pagam pelos incautos

uma e outra e outra vez.

Isto é o que sei e sinto.

E lamento, lamento,

mas outra coisa não sei.

Sei que o tempo passa, que a vida foge, que o amor é incerto,

que a poesia existe onde menos se a espera.

E lamento, lamento: como falar do que não sei?

Como fazê-lo?

Soubesse e cantá-lo-ia!

Pudesse eu! E cantá-lo-ia!


 ***

 

LA BALADA IMPOSIBLE

Cantaría, sí podría,

un poema completamente nuevo – un poema

de héroes limpios y seductores

de héroes que hablasen ininterrumpidamente la novilengua

donde todo es igual a todo

pero no a la realidad.

Poema

sin fanáticos degollando,

sin dioses que incitan al odio y a la destrucción,

sin Ángel Gabriel a traficar misales y heroína.

¡Oh, sí, lo cantaría!

Un poema cuidadoso y tibio

donde no estuviesen

panfletos y jeringuillas, mariposas afiladas,

turbantes  y odio,

angéles cortadores de collos,

querubines de pelo corto y Doc Martens en los pies,

profetas y patriarcas que se comercian con

millones,

corrupciones, euros,

baluartes anchos de vicio y crimen en

el Parlamento de Donde-sea,

dólares, yenes,

pagarés  ocultos, bancas insolventes,

 vetustos ominosos curas chamuscados 

de vientos de súlfur,

religiones de odio y dolor

pedófilos y creyentes,

emires y verdugos devotos,

penitentes caritativos y malos

asesinos de honores y de vidas,

matadores de alabanza a dios,

patriarcas de fuste armani y barba inconsútil,

santos groseros que abandonan morabitos inverosímiles,

lumbersexuales proféticos alzando voces a

los cielos de la Nada,

adoradores de la muerte de los otros,

galope de homicidas,

ermitaño para ver a dios en las páginas de Vogue,

jhiadistas para posar para los canales de la moda,

monjes sombríos de sangre en la solapa,

hombres muy limpios a poner alcanfor en los aires impolutos,

multitudes bajo los puentes de Londres

en una Tierra siempre Baldia, desgastada

y estéril, donde ni Flebas, el fenicio, llegaria a la costa.

Poema donde no viviese nada, nada impactase,

donde viviese solamente

el exactamente

consentido. 

El Nuevo Tiempo es el viejo tiempo, es todo el tiempo.

Si pudiera lo cantaría,

en un poema nuevo, revitalizado y oficial,

donde bailarían polcas y mártires decadentes 

¡Si, lo cantaría!

Vírgenes tontas pariendo,

sin embargo, pariendo, entre sístoles y geografías.

Lo cantaría entre los vanos de cada ventana, detrás o

delante de los cristales sin abrir.

Todo un nuevo poema de construcción pseudo-destructiva

al gusto del tiempo, bien al gusto del tiempo

lleno de palabras correctas y ninguna que sea prohibida,

todo la trampa verbal donde se diga lo que el otro

quiere oír,

bien al gusto de las pequeñas tormentas  del espíritu más simplón,

un poema de manos anchas

siempre declarándose anticonvencional,

moderno, guay, más que moderno: modernón,

poema de ideas sueltas, para inaugurar un estilo,

poema de ideas excrementales

--aunque un poema no esté hecho tanto

de ideas sino de palabras-

y de palabras que puedan parecer feroces, pero no muerden,

de palabras que pretenden ser aradas en el azufre de la lengua,

en la crudeza gris de los purgatorios muertos,

en el execrable laberinto de infinitas cuevas;

pero al fin y al cabo, palabras educaditas,

dadas a luz en laboratorios mansos

donde la creación sea afable y el ministro consienta

y la iglesia lo permita

e y la economía no lo prohíba .

Yo lo cantaría, por tanto, como un heraldo de los nuevos tiempos

pero aparentando contracorriente, contradicción, contrasentido,

contravención, contracultura

pero al fin solo falsificación, tú lo sabes..

pero esperando, por supuesto, a la contrapartida,

un poema donde el Lobo de Rímini nunca sodomizaría

al pequeño Obispo Fano,

nuncio papal en tiempos convulsionados,

un poema aséptico, sin gulags,

sin campos de concentración,

sin muros y sin bombardas,

un poema donde los ríos corriesen limpios 

como los de Rodrigues Lobo,

los anhelos fusen todavía los de Bernardim

y los aires para siempre respirables;

y donde yo me proclamaría

diciendo sonoramente "mis

palabras están talladas por el cincel de la exclamación pútrida,

de la pútrida arquitectura ",

-- pero no, mi amor, ¡sabes que no lo serían! –

y yo anunciaría falsamente, en el soberbio

lenguaje de los tontos ahora inteligentes

 "¡he aquí mis versos, edificios de escándalo!,

¡aquí está mi poema, barco condenado! 

esta es mi Palabra, taller de vicios y desprecios!

he aquí mi trote salvaje en la garganta maldita de los serafines caídos!"

pero todo sonaría como el hueco, ya lo sabes,

todo como a un nido de palabras narcóticas.

Yo lo cantaría, si todo

lo que se agita en mi alma no fueran

palabras indescifrables en la boca quemada de dios,

en la boca desdentada de dios,

palabras fusiladas una a una sobre la decencia de las cosas,

palabras de Ítacas quemadas,

versos que fuesen un Moloch pierna de palo

una aritmética de  succubus y doncellas podridas,

de mendigos, de tus mendigos , ¡Álvaro!, meando  sobre nuestros

destinos y propósitos,

llama encendida, aceite frío sobre las dimensiones del tiempo,

roca vidriada,

marca de agua de querubines y quimeras que

buscasen en la basura algo qué comer.

¡Oh, se yo lo pudiera! ¡se pudiera lo cantaría!

Yo lo cantaría, a ese nuevo poema en el que no

hubiese tierra dura sino solamente

nubes diluidas en la inmensidad del cielo;

en el que no viniesen a mirar mendigos,

harapos, pobres, chozas,

 miserias  no ocultas,

y donde todo era un benigno rayo de sol y

un elogio aunque enmascarado.

Si lo pudiera¡ y yo sería un poeta maldito, el

Poeta Maldito,

el aparentemente no tolerado,

 el Irreverente,

pero, bien, muy acariñado por los poderes,

bendecido por todas las santidades,

alabado por todos los despachos.

¡Se lo pudiera! y escribiría este nuevo poema

sin estafas inconmensurables, sin cortabolsas que

van con la patria en la solapa, sin malhechores de posición  y lábaro.

En el no habría olores de John Huss quemado,

ningún grito de Steve Biko golpeado,

ninguna agonía de los kurdos,

ningún Khashoggi descuartizado,

ningún banco robado desde dentro,

ninguna mujer violada en los cárceles de Pinochet,

 ningún poeta decapitado en los ergástulos saudíes,

ninguna mazmorra con agua, ningún crimen de guerra,

ningún muerto indefenso en las calles de Myanmar

ninguna bomba largada sobre Yemen,

ningún anciano solitario en una buhardilla olvidada,

ninguna venta de armas democráticas,

ninguna Libia en llamas,

ninguna biblioteca ardiendo,

ningún voto burlado,

ningún arrimado a expensas del baúl público.

Sería un poema sumiso aunque protestara insumisión, 

un poema delicado a pesar de que parecía revoluciones,

golpeando tres veces en el pecho el nombre de la revuelta

y otras tantas veces la negara al golpear cada letra del teclado suave.

Sería un poema donde ningún Perseu decapitaría a Medusa,

donde nunca se conocería Palmira la Vieja arrasada

y Khaled al-Asaad decapitado por amor a ella.

En él Maldoror no encontraría un Lautréamont para cantarlo,

 a el Mutilado no le cortaban las manos

ni Judas besaba a Cristo al cantar de las lunas por la ciudad.

Nadie allí se levantaría, como dices, Uberto,

contra los  versos exquisitos y subalternos,

encadenados a las excavadoras

para detener la destrucción de su tierra y su conciencia,

y todos estaríamos invitados a los palacios de Doñana.

¡Oh, lo cantaría! Un poema

que fuese un silencio largo y amplio, aunque

hecho de muchas palabras,

una oda muerta

una lista de alejandrinas secas,

flores del bien vomitando baudelaires.

Una canción aplaudida por analfabetos funcionales,

llevada a la televisión en horario de máxima audición ,

galardonada oficialmente con pendones

y órdenes protocolares,

gratificada con pagos públicos,

suavizada con los mejores cosméticos,

 perfume y rosas y

sonidos pregrabados de primaveras y arroyos,

solo cosas dulces y suaves,

amores translucidos  perfectos

rosas defoliadas s para crear contexto y luz.

Y sin cualquiera  aflicción,

sin el borracho feliz que hable a solo, mi bueno Cesário,

y ningún que enseñe a la hija a leer a la luz del petróleo.

Pero lo que sé y siento no encajaría jamás en el poema.

Lo que sé y siento son puñales, misterios,

peones muertos en las trincheras en cada flandres

que podrían existir,

grumetes colgados de los mástiles,

pájaros equivocados,

gente que va al lecho hambrienta,

abuelos abandonados,

secretarios bellacos,  profetas atracadores,

ladrones de treciopelos y carmínes,

banqueros que revolotean en bandadas

al olor fresco de la sangre de la manada.

Lo que sé son personas olvidadas en los rincones de la vida,

derribadas en las agendas de las economías,

ahogadas en el vacío de las estadísticas.

Paso la página del alma y los grabados reproducen islas

donde aún estalla la miseria,

barrios de degredo e impureza,

droga urgente, clandestina,  cáustica –

y mandarines perniciosos en la majestuosa luz de los bonzos,

régulos capataces  de las grandes Comisiones,

títeres monumentales para dirigir la orquesta del mundo,

tontos dudosos apoyados en la ventana alta de la Tierra,

Camões pidiendo la triste limosna.

Ningún río corre sin presas que le atropellen  

y todas se venden y todas se compran

y todos las acaban pagando los incautos

una y otra vez.

Esto es lo que sé y percibo.

Y lo siento, lo siento,

pero no sé nada más.

Sé que el tiempo pasa, que la vida se escapa, que el amor es incierto,

que la poesía existe donde menos se lo espera.

Y lo siento, lo siento, ¿cómo hablaría de lo que no sé?

¿Cómo hacerlo?

¡si lo supiese  lo cantaría!

¡Si lo pudiera, ah, lo cantaría!



 FERNANDO CABRITA  2021

En: Letras en la Raya. A.C. El Libro Feroz. Aracena, 2023

 

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