documentos de pensamiento radical

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jueves, 24 de septiembre de 2020

SAUDADE



Um dia reparamos como desapareceram

ardósias  ardoiças

alfarrabistas aventais

alegretes pequeninos onde sorria uma dália

ou outra flor antiga

e que o que resta é o eco do eco da voz dos mortos

a voz fria das coisas que um dia foram presença e luz

o rio exausto e seco do que inapercebidamente foi

 

Um dia há em que reparamos que um retrato se escorreu da moldura

que uma fresta por onde voava a luz se entaipou

E já não sabemos recordar o que nunca iríamos ter que recordar,

o que era e seria,

o presente para sempre

Os que foram como foram e já não são

bedéis bufarinheiros

berlindes boninas

cântaros e cabaças

cálices castiçais

Tudo perdido na cânfora dos dias

Tudo sumido em desfiladeiros e passagens que a seguir se ocultam

Tudo caminhos de nada a nada

onde se perderam os que viajavam connosco,

os comboios a esfumar-se em tíbios horizontes,

o vento a ir-se, esguio a ir-se, a ir-se.

 

E olhamos o céu que havia certo e seguro,

céu rútilo para sempre, amável para sempre, delicado para sempre,

e o que vemos são céus outros de modalidades pardas,

policromias raras e difíceis fantasmas de fantasmas

espectros de espectros ,

todos debruçados a vastas melancolias

paredões vagos onde se putrem os fuzilados pelo tempo

dedais  dolências  domingos tristes

nomes coisas criaturas que foram felizes connosco

ao sol quando havia sol, à chuva quando havia chuva

navios disparados contra o vento,

sonhos que se iam

ausências vagas

hibiscos mortos a crescer em ignoradas margens,

uma brisa no Sul

aquele outro Sul derradeiro e extinto,

um sorriso aberto que se cerrou um dia,

uma estátua antiga que se delinquiu,

 um móvel velho onde já só resta a loiça quebrada

empreitas e enxergas, ermidas ergástulos

onde se exauriram sonhos e despedidas,

rochas que sibilavam de águas e loendros

farófias fuligens festões farelos,

casinhas antigas que já não assomam na distância,

Senhoras Nagonia que vão que iam tão lindas barra fora

no seu erro de ortografia

E esses livros que líamos e agora não sabemos onde ficaram

E as folhas rasgadas da vida que falta,

griséus guaritas ganchorras guisos gorpelhas gargantilhas

da prata mais argentina

golilhas que recendem no silêncio entre opalas e açores

jeropigas, latões lapiseiras lilases

lanterninhas a ofuscar o escuro

sons moribundos de arrastadas grafonolas,

gente apressada em aeroportos,

gente que corre, gente de portão a portão,B6: A 40:

Porta 24; senhores passageiros, atenção, vai dar entrada na

linha número seis um sonho que supúnhamos perdido para sempre,

vedado para a eternidade,

uma fantasia anciã,

um belo memorial de coisas desvanecidas

mistérios mantilhas mortalhas

a substância cruel da realidade

nortadas nozes natais em família Nau Catrineta de navegações distendidas

corações desocultados

sentimentos por oceanos impossiveis

ossários ousios oratórios ourelos que os anos descabelaram

peles vazias de coisa nenhuma

tessituras ocas

ocas bandeiras

hinos

candil tremente a liquefazer-se

e nós sorrindo como se nada fosse quando já nada é

Bom dia, bons-dias, tudo bem, sim, claro, tudo bem,

pandeiretas podengos pobres pilhetas pim pam pum

um fado de uma Severa a que faltou a voz,

altares caídos na penumbra de um nada

casas devassadas  janelas que não mais se abriram

 e nenhum horizonte, nenhum horizonte, nenhum horizonte

já nenhum horizonte

árvores que deixaram de crescer

deuses distraídos a consentir-se naufragar

quebrantos, querubins quermesses

circunavegação por mares inventados

como um verbo a que desse a deusa ceptro e justiça

 e descessem nele as aves a buscar um ninho

roseirais  ribeiras  récuas

sebentas  serões  searas

sombrinhas serestas por guitarras desacordes

plangentes flautins em notas perdidas,

pianos a que falta uma tecla,

batéis desenxutos ,

vestidos de cerimónia remordidos pela traça,

becos sem saída onde chora um gato aflito,

tairocas, terrinas, toldos  

toda essa tintura de iodo dos espíritos inadormecidos

tragédias pessoais em que revíamos os anos que iam e vinham

e se sentavam no poial das portas, o velho e o burro,

as mãozinhas de metal que batiam nas venezianas

unguentos

vozes, vizinhas velas por soprar, valados , voragens de meses sobre meses

e almas desgarradas, candelabros onde soprou um vento bom

e a luz e a luz e a luz,

tudo o que interrompe mas nunca acaba

ecos ecos ecosecoecoececeeeeeeeeeeee

e as poucas madrugadas onde não brilhasse o sol

ou não viesse a nostalgia de um amor perdido

essa carmínia voz do fogo uum semblante de alguém

que soubemos quem era e hoje não sabemos quem é

rosmaninho onde demora uma lembrança antiga

xailes

Zigurates, zangãos, zorrinhas

e tudo o que já não existe

E tudo o que já não existe

E tudo o que já não existe.

E vemos a vida passar em palavras que eram coisas

e vemos a vida a passar em detersão de sonhos

e vemos a vida a passar em rios que se secaram

e dias que se deliram

e vemos a vida a passar nos pássaros que deixaram de regressar aos beirais

E vemos a vida a passar nos nossos que se foram, pai, mãe,

os nossos, os nossos, os amigos, a família,

os nossos, os nossos doces animais, os nossos,

os que foram, os que foram,

os que foram

os que foram

como um alfabeto que não tivesse fim.

 

Fernando Cabrita. Missa Branca. Poesía a Sul, 2020  

Farol, 2018 / Oued el Hachef  2018

Fotografía de Carmen Lourdes Fdez. de Soto


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Un día notamos como desaparecieron


pizarras de pizarra


delantales de librería usados


pequeñas alegrías donde una dalia sonríe


u otra flor antigua


y que lo que queda es el eco del eco de la voz de los muertos


la voz fría de las cosas que alguna vez fueron presencia y luz


el río agotado y seco que pasó desapercibido


 


Un día notamos que un retrato ha goteado del marco


que una grieta por donde volaba la luz estaba bloqueada


Y ya no sabemos recordar lo que nunca tendríamos que recordar


que fue y que seria,


el presente para siempre


Los que eran como eran y ya no son


bedels de búfalo


gorras de canicas


jarras y calabazas


candelabros


Todo perdido en el alcanfor de los días


Todo desapareció en desfiladeros y pasajes que se esconden debajo


Todos los caminos de la nada a la nada


donde se perdieron los que viajaban con nosotros,


los trenes se desvanecen en horizontes tibios,


el viento para ir, delgado para ir, para ir.


 


Y miramos el cielo que estaba seguro y a salvo,


cielo rutilo para siempre, amable para siempre, delicado para siempre,


y lo que vemos son otros cielos de modalidades marrones,


fantasmas policromos raros y difíciles de fantasmas


espectros de espectro,


todo inclinado sobre vasta melancolía


malecones vacíos donde los asesinados por el tiempo son ejecutados


dedales tristes


nombra cosas criaturas que estaban felices con nosotros


en el sol cuando había sol, en la lluvia cuando llovía


barcos disparados al viento,


sueños que se fueron


ausencias vagas


hibisco muerto creciendo en bancos ignorados,


una brisa en el sur


ese otro último y extinto Sur,


una sonrisa abierta que se cerró un día,


una estatua antigua que era delincuente,


 un mueble viejo donde solo quedan los platos rotos


contratistas y persianas, ermitas y ergastulas


donde los sueños y las despedidas se agotaron,


rocas que silbaban de aguas y adelfas


farofias hollín, guirnaldas de salvado,


casas antiguas que ya no perduran en la distancia,


Nagonia damas que iban tan hermosas fuera del bar


en tu error de ortografía


Y esos libros que leemos y ahora no sabemos dónde estaban


Y las hojas rotas de la vida perdida


gargantillas grises gargantas disfraces gorpelhas gargantillas


la plata más argentina


kebabs que huelen en el silencio entre ópalos y azores


jeropigas, lapices de latón lilas


linternas que eclipsan la oscuridad


sonidos moribundos de arrastrar graffiti,


gente apresurada en los aeropuertos,


gente que corre, gente de puerta en puerta, B6: A 40:


Puerto 24; Pasajeros, atención, ingresarán al


línea número seis un sueño que creíamos perdido para siempre,


sellado por la eternidad,


una vieja fantasía


un hermoso memorial de cosas descoloridas


misterios tocados mortajas


la cruel sustancia de la realidad


norten navidad nueces en familia Nau Catrineta de navegaciones distendidas


corazones desvelados


sentimientos por océanos imposibles


osarios atrevidos oratorios tobilleras que los años han despeinado


nada pieles vacías


tejidos huecos


banderas huecas


himnos


candil tembloroso para licuar


y estamos sonriendo como si nada es cuando nada es


Buenos días, buenos días, está bien, sí, por supuesto, está bien,


pandeiretas podengos pobres pilhetas pim pam pum


un destino de una Severa a la que le faltaba la voz,


altares caídos en las sombras de ninguna parte


las casas caprichosas ventanas que ya no se abrían


 y sin horizonte, sin horizonte, sin horizonte


ya no hay horizonte


árboles que han dejado de crecer


dioses distraídos para consentir en hundirse


quebrantos, querubines quermesses


circunnavegación por mares inventados


como un verbo para dar a la diosa cetro y justicia


 y dejar que los pájaros bajen en busca de un nido


rosales arroyos


seiscientos campos de maíz


serenata paraguas por guitarras desacuerdos


flautín quejumbroso en notas faltantes,


a los pianos les falta una tecla,


porras resbaladizas,


vestidos ceremoniales que recuerdan a la polilla,


callejones sin salida donde un gato afligido llora,


tairocas, terrinas, toldos


toda esta tintura de yodo de los espíritus inconscientes


tragedias personales en las que repasamos los años que iban y venían


y se sentó en la parte de atrás de las puertas, el anciano y el burro,


las manitas de metal que golpean las contraventanas


ungüentos


voces, velas vecinas para soplar, zanjas, torbellinos de meses y meses


y almas extraviadas, candelabros donde soplaba un buen viento


y la luz y la luz y la luz,


todo lo que interrumpe pero nunca termina


Ecos Ecos Ecosecoecoececeeeeeeeeeeee


y los pocos amaneceres donde no brillaba el sol


o no vendría la nostalgia de un amor perdido


esa carminia voz de fuego un semblante de alguien


que sabíamos quien era y hoy no sabemos quien es


romero donde lleva un viejo recuerdo


chales


Zigurats, drones, santos


y todo lo que ya no existe


Y todo lo que ya no existe


Y todo lo que ya no existe.


Y vemos pasar la vida en palabras que eran cosas


y vemos que la vida continúa en sueños


y vemos pasar la vida en ríos que se han secado


y dias delirantes


y vemos pasar la vida en los pájaros que ya no mandan 

 

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